Como fazer a higiene do sono? Veja quais são os maiores inimigos de uma noite restauradora
Médicos alertam que telas e cafeína à noite atrasam o adormecer e fragmentam o sono, afetando atenção, humor e desempenho no dia seguinte. Entenda o que é...

Médicos alertam que telas e cafeína à noite atrasam o adormecer e fragmentam o sono, afetando atenção, humor e desempenho no dia seguinte. Entenda o que é higiene do sono e como atividades ao longo de todo o dia podem afetar a qualidade do descanso. Como fazer a higiene do sono? Veja quais são os maiores inimigos de uma noite restauradora Adormecer pode parecer algo simples para muita gente — especialmente para quem se sente esgotado e afirma não ter dificuldades para dormir. No entanto, falhas na chamada higiene do sono, somadas a certos hábitos ao longo do dia, podem provocar despertares que comprometem a qualidade do descanso como um todo. Segundo especialistas ouvidos pelo g1, os maiores inimigos de uma noite restauradora são o uso excessivo de telas e a falta de rotina. Nesta reportagem, você entenderá como eliminar esses obstáculos e garantir que acordará "novo" de manhã. Excesso de telas e falta de rotina são apontados como os maiores desafios para dormir bem, segundo especialistas Adobe Stock ➡️Higiene do sono é um conjunto de medidas e comportamentos adotados antes de dormir que ajudam a preparar o corpo e a mente para o descanso. Ou seja, são práticas que favorecem um repouso mais alinhado ao funcionamento natural do organismo. No entanto, atitudes ao longo de todo o dia — e não apenas no período noturno — também influenciam diretamente essa qualidade. ‘’O sono é um pilar para que todas as áreas da vida se conectem e funcionem. E o que mais estamos vendo hoje é um comportamento inadequado em relação ao dormir", afirma a pneumologista e especialista em sono Danielle Clímaco, membro do Conselho Administrativo da Academia Brasileira do Sono (ABS). "O sono é um momento crucial para garantir que se tenha uma vigília atenta e criativa, com resolução de problemas e bem-estar emocional, físico e mental.” A neurologista pediátrica e médica do sono Letícia Soster, também responsável pelo serviço de sono infantil do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), explica que, para o processo de adormecer, são necessários três fatores: círculo circadiano, fator homeostático (derivado do nosso cansaço) e fator comportamental. Entenda cada um deles abaixo. O círculo circadiano Nosso corpo funciona com base em diversos processos cíclicos — e o ritmo circadiano é o conjunto de eventos que ocorrem em um ciclo de 24 horas. Entre eles, destacam-se o metabolismo noturno, ligado ao período de sono, e o metabolismo diurno, relacionado ao estado de vigília. Todo esse funcionamento está profundamente conectado à alternância entre claro e escuro no ambiente. Esses ritmos influenciam diretamente a liberação de hormônios: ☀️ Pela manhã, há um pico de cortisol, que ajudam a nos manter alertas. 🌙 Já à noite, o corpo começa a produzir melatonina, hormônio essencial para o início do descanso. Tanto a liberação hormonal quanto hábitos como alimentação e prática de exercícios físicos são considerados "fatores circadianos" — ou seja, elementos que sinalizam para o corpo se é hora de estar ativo ou de repousar. ⚠️💡📺 A luz é um dos principais reguladores desse sistema. A claridade captada pelas células ganglionares da retina envia sinais ao cérebro de que ainda é dia, inibindo o início do metabolismo noturno. “Com a luz, o metabolismo da noite não vai acontecer. E a luz pode ser da TV, do celular ou da lâmpada. Além disso, o barulho pode funcionar como um condicionador e também como um distrator. Aí, eu vou me distrair daquele processo natural de adormecer, do processo de entrega”, explica a especialista Soster. Ela reforça que nosso corpo é sincronizado com a natureza — e o escurecer do fim do dia funciona como um aviso para o cérebro de que está na hora de desacelerar. Por isso, é recomendável reduzir a exposição à luz artificial pelo menos duas horas antes de dormir. Uso de telas na cama aumenta o risco de insônia em 59% Orientações para dormir melhor • Diminuição da exposição luminosa, principalmente as telas: Como a gente não tem um botão para mostrar que é hora de dormir, nosso corpo precisa ser preparado para o processo de dormir, com diminuição da exposição à luz – seja TV, tela de celular, ou luz dos cômodos. Isso ajuda na liberação de melatonina, para que para que o indivíduo tenha a ‘permissão’ para o sono acontecer. Por isso, não é recomendado levar computador para a cama e ter TV no quarto. O uso excessivo de telas vem comprometimento o neurodesenvolvimento e a performance acadêmica adequada, além de alterações da função executiva, segundo estudos. “O excesso de telas tem apontado a associação com uma propensão para a obesidade, alterações de sono e condições com prejuízos na saúde mental, incluindo depressão e ansiedade, comprometendo a qualidade do sono e favorecendo essas desordens”, complementa Clímaco. • Não ingerir estimulantes com cafeína, a partir do fim da tarde e noite. Segundo Clímaco, a cafeína é um dos componentes mais citados nos estudos observacionais e de intervenção. Ela tem um potencial grande de interferir com o início do sono e até com a manutenção dele, por ter o potencial de fragmentar a arquitetura do sono e fazer o indivíduo despertar no meio da noite, além de aumentar o tempo para o início do sono, ou seja o adormecer de fato, após deitar-se. “Mesmo indivíduos que consumem cafeína mais tarde e falam que conseguem deitar-se e dormir logo, podem não estar relacionando os despertares no meio da noite a esse consumo mais exagerado de cafeína próximo ao horário de dormir”, destaca Clímaco. O fator homeostático As atividades físicas e mentais realizadas ao longo do dia levam à quebra de moléculas de energia, que liberam componentes na circulação, principalmente no cérebro. Um desses subprodutos é a adenosina — cuja concentração crescente é percebida pelo organismo como cansaço. É esse acúmulo que sinaliza ao cérebro que é hora de repousar. Quanto mais adenosina é produzida como resultado da vigília e da movimentação durante o dia, maior é a “pressão” que o corpo sente para dormir à noite — é o chamado fator homeostático. O fator comportamental Para a especialista Soster, o sono é um processo de entrega. Mas ela propõe uma reflexão: o que a pessoa faz com o próprio cansaço? Como lida com o estresse, a ansiedade e os pensamentos acelerados no momento em que deveria relaxar? Muitas vezes, há uma dependência de estímulos para adormecer: adultos que só conseguem pegar no sono com a TV ligada, crianças que precisam mamar ou ter barulho (ou silêncio absoluto). Mas o ideal é criar um ambiente propício ao relaxamento, evitando estímulos físicos e mentais no período noturno. Entre os cuidados recomendados, estão: evitar atividades estressantes, reduzir o uso de telas e não consumir alimentos ou bebidas com cafeína a partir do fim da tarde. Para as crianças, até achocolatados devem ser evitados nesse período. Hábitos diurnos que favorecem um sono de qualidade Diversos comportamentos ao longo do dia — e não apenas à noite — influenciam diretamente a qualidade do sono. Veja a seguir algumas orientações de especialistas para melhorar esse processo: Moderar o consumo de álcool Embora algumas pessoas relatem usar bebidas alcoólicas para facilitar o início do sono, o efeito pode ser o oposto ao desejado. O álcool aumenta a chance de despertares noturnos e fragmenta o descanso, levando a uma noite pouco reparadora. Além disso, interfere no tônus muscular, o que favorece o ronco e episódios de apneia obstrutiva. Manter-se ativo ao longo do dia A baixa quantidade de estímulos físicos e mentais reduz a produção de adenosina — substância que se acumula ao longo da vigília e está ligada à sensação de cansaço. Com menos adenosina, o corpo sente menos necessidade de descansar à noite. Estabelecer horários regulares Manter uma rotina organizada, com horários definidos para as refeições, atividades físicas e o momento de se desconectar, ajuda a regular os ritmos biológicos e favorece um sono mais consistente. Evitar exercícios físicos à noite A prática de atividade física regular traz benefícios para o corpo e a mente, especialmente quando feita em horários adequados. Segundo o médico Clímaco, o ideal é se exercitar pela manhã ou no início da tarde. À noite, o aumento da temperatura corporal pode dificultar o adormecer, já que o corpo precisa esfriar para iniciar o processo de descanso. Evitar ambientes muito quentes antes de dormir Temperaturas elevadas atrapalham a manutenção do sono. Dormir em um local mais fresco e confortável pode ajudar na qualidade do repouso. Controlar os cochilos Evite dormir durante o dia por longos períodos ou em horários muito próximos da noite. Se precisar cochilar, que seja por no máximo 30 minutos e preferencialmente até o meio da tarde. Evitar alimentos pesados à noite Refeições ricas em gordura ou de difícil digestão exigem mais do sistema digestivo e aumentam o risco de desconfortos como refluxo e interrupções no sono. A especialista em sono Denise Soster chama atenção para uma crença comum: a de que o sono acontece automaticamente, independentemente da rotina ou do ambiente. “As pessoas têm uma crença de que vão dormir de qualquer jeito, de que o sono é uma coisa automática. Não acreditam que a TV pode atrapalhar, e o maior desafio para a especialista em sono é justamente a tela.” Segundo ela, o excesso de estímulos no fim do dia dificulta a desconexão, um passo essencial para o início do repouso: “A recomendação mais difícil é fazer todo mundo desligar no final do dia. Desligar está difícil, porque manter-se ligado acaba sendo aquilo que as pessoas mais valorizam.” Ela ainda alerta que adormecer com a TV ligada não significa que o corpo esteja descansando da forma correta: “Eu costumo dizer que você dorme de TV ligada, mas você dorme sem sua melatonina ter sido liberada. O que eu vejo de mais comum é um desconhecimento amplo sobre o que é o sono, o que é o processo de dormir.” O estresse crônico, a automedicação e os parceiros que roncam Além dos hábitos inadequados ao longo do dia, algumas condições específicas também prejudicam o descanso noturno. Entre elas estão o estresse crônico, o uso de medicamentos sem prescrição e o compartilhamento do quarto com alguém que ronca ou apresenta apneia do sono. “Muitas vezes, a gente atende pacientes que não estão dormindo mais, porque [quem está ao lado] ronca, tem apneia e não se trata. Ou seja, o casal não dorme bem. Se mesmo com alterações na rotina, não houver melhora, a pessoa deve procurar um especialista em sono”, afirma o médico Clímaco. Alguns medicamentos podem ter efeito negativo sobre o sono, especialmente aqueles que relaxam excessivamente a musculatura — favorecendo ou agravando quadros de apneia. É o caso de certos sedativos: apesar de facilitarem o adormecer, podem levar ao desenvolvimento de distúrbios respiratórios durante a noite. Por isso, é importante buscar orientação médica, de preferência com um especialista na área, que possa identificar o tipo de queixa apresentada: dificuldade para iniciar o sono ou para mantê-lo em horários regulares. “Uma alteração de ritmo circadiano muitas vezes se confunde com insônia. Então, todo indivíduo deve seguir as instruções de higiene do sono, porque isso significa um estilo de vida mais saudável”, defende Clímaco. Os desafios para crianças Em relação às crianças, Clímaco destaca que a intervenção deve ser ainda maior. “Estamos vendo crianças e maratonando séries, sem horário regular para dormir, em uma fase do neurodesenvolvimento responsável pela aquisição de habilidades e pela memória." Horas de sono recomendadas por faixa etária, segundo a National Sleep Foundation: Recém-nascidos (0–3 meses): 14 a 17 horas Bebês (4–11 meses): 12 a 15 horas Crianças pequenas (1–2 anos): 11 a 14 horas Pré-escolares (3–5 anos): 10 a 13 horas Crianças (6–13 anos): 9 a 11 horas Adolescentes (14–17 anos): 8 a 10 horas Adultos jovens (18–25 anos): 7 a 9 horas Adultos (26–64 anos): 7 a 9 horas Idosos (65+ anos): 7 a 8 horas LEIA TAMBÉM: Dormir mal pode aumentar insegurança e ciúme, aponta estudo Anvisa suspende suplementos vitamínicos vendidos para sono e dor muscular; veja a lista